MÚSICA
COLETÂNEA DE VÍDEO: ALAGOAS NOSSA TERRA
DVD 04 - Música
Argumento: BASÍLIO SÉ
Depoimentos: ALMIR MEDEIROS, BASÍLIO SÉ, DEYVES, EDSON BEZERRA, JÚNIOR ALMEIDA, LELO MACENA, MÁCLEIM, ROBERTO BARBOSA, WADO e WILSON MIRANDA
Informações da página:
revisada em maio de 2014
"Depois do silêncio, o que mais se aproxima de expressar o inexprimível é a música."
Aldous Huxley
O que é Música:
Música é a combinação de ritmo, harmonia e melodia, de maneira agradável ao ouvido. No sentido amplo é a organização temporal de sons e silêncios (pausas). No sentido restrito, é a arte de coordenar e transmitir efeitos sonoros, harmoniosos e esteticamente válidos, podendo ser transmitida através da voz ou de instrumentos musicais.
A música é uma manifestação artística e cultural de um povo, em determinada época ou região. A música é um veículo usado para expressar os sentimentos.
A música evoluiu através dos séculos, resultando numa grande variedade de gêneros musicais, entre eles, a música sacra ou religiosa, a erudita ou clássica, a popular e a tradicional ou folclórica. Cada um dos gêneros musicais possuem uma série de subgêneros e estilos.
Música erudita ou clássica
Música erudita ou clássica é uma música bem elaborada, que foge das tradições populares. É uma música culta, caracterizada pela simetria e equilíbrio sonoro. Teve sua origem na necessidade de aumento do poder expressivo das melodias nos ofícios religiosos.
A música erudita ou clássica é caracterizada por uma música refinada e agradável, apresentada de forma instrumental, que chegou ao ápice com os grandes gênios da música, entre eles, Haendel, Bach, Haydn, Mozar e Beethoven.
A expressão "música clássica" passou a ser usada para representar a evolução musical no século XIX, chamado século de ouro, dos grandes compositores.
Ópera
Ópera é uma obra dramática em que o teatro, a música e a poesia se completam. A ópera é um gênero teatral dramático, encenado junto com a música instrumental e o canto, no qual se sobressai um solista, representado por cantores com timbres vocais que vão do mais agudo até os mais graves.
A ópera é encenada com os elementos do teatro, como enredo, coreografia e vestuário característico, em conjunto com a música instrumental e o canto.
Ópera é o plural de opus, que no latim significa obra de arte. A ópera surgiu na Itália, e geralmente é apresentada em latim ou italiano.
Música popular
Música popular é aquela que tem uma letra predominantemente romântica, jovem, dançante e com refrões fáceis de memorizar. O rock foi um dos mais bem sucedidos gêneros da música popular, seguido da música romântica.
A música popular brasileira recebeu influência de diversas escolas, entre elas a de João Gilberto, com a precisão técnica e a interpretação contida, e a escola de Elis Regina, com interpretação sentimental, em que a emoção importa mais do que a técnica. Michael Jackson e Madona serviram de parâmetro para o pop americano e para um grande número de seguidores.
A música popular cantada por grandes nomes do showbiz, com melodias suaves e rítmos dançantes, se enraizou na cultura da juventude urbana, virou sucesso comercial e é um dos mais bem sucedidos gêneros da música contemporânea.
Música tradicional
Música tradicional ou folclórica é aquela que simboliza as tradições e costumes de um povo, e são passadas de geração a geração, como parte dos valores e da identidade de um povo. A música tradicional representa as crenças e as tradições de uma determinada região.
Grande parte da música folclórica possui letra de fácil memorização e está ligada às festividades, envolvendo danças típicas de uma determinada cultura.
A música tradicional ou folclórica, está intimamente ligada à música popular. O fado, o tango, o samba, o frevo, o forró, a música de viola, a música sertaneja, o maracatu, o reggae, o blues, entre outras, se perpetuaram e muitas delas exercem grande influência na música moderna.
BREVE HISTÓRIA DA MÚSICA EM ALAGOAS
por BASÍLIO SÉ
A história da música em alagoas é contada pelo povo nas inúmeras realizações produtivas de seus músicos, compositores, intérpretes, apreciadores e também uma pequena produção escrita. O livro “Alagoas e seus Músicos” de Joel Belo Soares, “Cadernos de Compositores Alagoanos” publicados pelo curso de Música nos anos oitentas, O “Song Book” da Academia Musical e alguns textos publicados na internet por pesquisadores independentes são exemplos de contribuições para o registro de nossa música.
Para um entendimento mais simplificado da questão iremos dividir a história da música alagoana em três períodos básicos.
O primeiro que vai da segunda metade do século XIX até meados do século XX; o segundo com as décadas de sessenta, setenta e oitenta; por fim, o período contemporâneo entendendo-se dos anos noventa aos dias atuais. É bom que se diga, entretanto, que todo o discurso aqui produzido torna-se hipotético mediante a ausência de pesquisa que reúna em documento oficial a história da música em Alagoas.
Esses períodos como são de supor, estão associados aos movimentos surgidos no Brasil recebendo, pois, suas influências. Só para ilustrar, no início do século XX o movimento dos chorões e sambistas pelo reconhecimento profissional da classe foi de relevância ímpar para a música de todo o país. A partir de então, o divisor de águas na figura de Heitor Villa-Lobos, apareceu propondo à música brasileira uma identificação característica. Foi Villa-Lobos, depois de excursionar pelo Brasil com suas pesquisas sonoras, quem anunciou para o mundo que a música aqui produzida tinha forma.
Por essa época era comum o músico alagoano estudar no Rio de Janeiro com professores ligados aos movimentos nacionais como Arminda Villa-Lobos, Souza Lima e, entre outros. Carmen Xavier de Almeida, Esther da Costa Barros, Maria de Lourdes Caldas (estudou, por exemplo, com Arminda), Heckel Tavares (aluno de Souza Lima) são alguns dos muitos músicos que se deslocaram daqui para o Rio de Janeiro estudar ou ganhar a vida com música.
Alagoas é um Estado marcado por diversos movimentos sociais. Seu território potâmico é cortado por onze vales como sendo os rios Moxotó, Capiá, Ipanema, Traipu, Coruripe, São Miguel, Paraíba, Mundaú, Santo Antônio Grande, Camaragibe e Manguaba além do complexo lagunar Mundaú e Manguaba. Banhada pelo maior rio brasileiro, o São Francisco, Alagoas está situada geograficamente na região menos árida do Nordeste às margens do Oceano Atlântico. Essa situação de relevo geográfico antecipou sua independência física da política como também uma diferenciação cultural das demais regiões. Pois aqui duas situações de colonização se observaram: ao norte ou Alagoas Boreal com o cultivo da cana-de-açúcar e no sul ou Alagoas Meridional com a criação de gado, assim afirma Dirceu Lindoso.
O antropólogo Sílvio Romero em seu livro - Cantos Populares do Brasil - livro publicado no final do século XIX, fala de um costume popular próprio das regiões ribeirinhas e praieiras. Diz ser comum nessas regiões a bebida alcoólica (pinga ou aguardente de cana) como também o dom musical entre as pessoas. Talvez isso explique os vários pólos musicais espalhados por todo Estado de Alagoas e, conhecidentemente, a maioria deles em cidades banhadas por rios, lagoas ou praias como é Traipu, Santa Luzia do Norte, Marechal Deodoro, Penedo, Pão de Açúcar, Viçosa, Rio Largo e Matriz de Camaragibe. Importante se observar é que nesses pólos referenciais citados o instrumento comum desenvolvido inicialmente foi o de sopro. Sax, clarinete, requinta, trompete, trombone, bombardino e tuba, obviamente trazidos pelos colonizadores, são os instrumentos de composição das bandas de musicais vistas por todo o Estado até hoje.
A diferenciação cultural do povo alagoano como resultado concreto está na naturalidade criativa das manifestações folclóricas influenciadas pela musicalidade afro-decendente através dos instrumentos percussivos. Reisado, Guerreiro, Baianas, Taieira, Quilombo, Esquenta Mulé, Boi de Carnaval, Embolada, Martelo, Toada, etc. são na verdade a base de identificação ou sotaque da nossa música. É certo que o sistema tonal de doze sons introduzido pelo colonizador mapeia não só a música produzida em Alagoas como em todo ocidente, mas, a forma como se compõe e interpreta é visceral de cada povo.
O ALVORECER
O primeiro período da música em alagoas é marcado por músicos e compositores a partir da segunda metade do século XIX quando ainda sofriam as amarras da forma euro-colonial de pensar. Muito embora, a presença da cultura africana no Brasil naquele momento já apontava o traço identificador com que nossa música iria seguir seu rumo.
São muitos os personagens na cena musical desse Estado que irão ficar ausentes de nossa memória por não terem suas obras preservadas ou mesmo destruídas pelas mãos insensíveis de criminosos memoriais. Como foi o caso, fato contado pelo povo, de um virtuoso músico Traipuense chamado “Nô Morcego” que teve suas obras queimadas por um conterrâneo de nome “Zé Cabeceira”. Contam que este músico era muito apegado à bebida alcoólica e virava noites bebendo solitariamente. No auge de sua lúcida embriaguês pegava papel e caneta, escrevia um choro, samba, maxixe, enfim, chamava o Sr. Eduardo Cocorote, trombonista de sua confiança, para executar a obra ali no pé do balcão do bar onde se encontrava.
Misael Domingues (Marechal Deodoro, 1857 – 1932) e Benedito Silva (Maceió, 1859 – 1921) são os primogênitos da nossa música no que diz respeito à projeção da mesma. Ambos escreveram os mais variados ritmos como polca, valsa, mazurca, dobrado, marcha, polca-carnavalesca, schottisch, maxixe, lundu, habanera, bolero, serenata, tango, pas-de-quatre, etc. Este último vencedor do concurso público como compositor do hino de Alagoas em 1896. Benedito era de uma versatalide musical impressionante, diz Moacir Medeiros de Sant’ana.
Da antiga capital de Alagoas, hoje Marechal Deodoro, saiu Misael Domingues no ano de 1869 para estudar em Maceió no colégio São Domingos onde seu irmão mais velho, Francisco Domingues, tinha sido nomeado vice-diretor. José Alfredo e José Procópio Galvão foram seus professores de piano onde a partir de então começou sua história musical. Diplomou-se em engenharia civil pela escola Politécnica no Rio de Janeiro no ano de 1885 e começou a trabalhar ano seguinte na estrada de ferro no Estado de Pernambuco. Misael Domingues faleceu em 1932 na cidade de Recife e suas obras encontram-se guardadas no Arquivo Público de Alagoas.
Já Benedito da Silva não teve a mesma sorte na vida a exemplo de Misael Domingues. Seu pai, Francisco Antônio da Silva, foi quem o ensinou o ofício da música valendo-lhe o apelido de Benedito Trompete, instrumento o qual dominava com proeza. Benedito da Silva foi instrumentista, compositor, regente e professor. Esteve à frente de muitas orquestras em Alagoas e outros Estados como Pernambuco, Amazonas, Bahia e Rio de janeiro. Depois de prestar valoroso serviço musical ao seu Estado por toda sua vida morreu amargando uma pobreza injusta no ano de 1921 em Maceió, sua cidade natal, totalmente esquecido pelo povo.
Dentre a variação de músicos e compositores que em Alagoas nasceram e tiveram suas projeções a partir de outros lugares citaremos Jararaca (Maceió, 1896 - Rio de Janeiro, 1977), com vasta obra popular, Heckel Tavares (Satuba, 1896 – Rio de Janeiro, 1969) mais ligado ao campo erudito, o maestro Fon-Fon e Augusto Calheiros (Murici/Maceió, 1891 – Rio de Janeiro, 1956) cantor popular. Todos tiveram repercussão nacional e internacional marcando época na história da música brasileira.
Até por volta dos anos cinquenta a radiofonia, a televisão e o cinema, devido à ausência de recursos tecnológicos, não tinham ainda atingido grandes proporções massivas. A freqüência de associações e escolas de música era comum se ver por todos os lugares. Tuna Alagoana, fundada por João Ulisses em 1904; Clube Atheneida, fundado em 1905; Círculo Musical, fundado em 1910; Juventude Musical Brasileiras, fundada pela Senhora Leda Collor de Mello em 1950; são algumas entre uma grande variação de associações existente na época. Eram essas associações e escolas quem promoviam os eventos artístico-musicais da época. Pois, como se vê, a música predominante nesse primeiro momento era de caráter acústico. Só a partir dos anos sessenta é que tudo começou a mudar de forma mais acelerada.
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DVD Palco Aberto: trecho com um artista.
A ERA LUNAR
A conquista do espaço pelo homem assanhou de vez a vida cultural da humanidade. Na música o advento jazzístico, que começara a ganhar projeção lá pelos anos vinte, sua estrutura harmônica influenciou os músicos brasileiros fazendo aparecer a “bossa nova” uma espécie de samba-jazz caracterizada mais pela sofisticação da harmonia.
O movimento bossanovista invadiu o país nos anos sessenta e nessa mesma década, após o golpe militar, dois outros movimentos surgiram com profundo reflexo sobre o povo brasileiro. A “Jovem Guarda” – baseada no movimento internacional do rock, mais precisamente pela impulsão do acontecimento Beatles, contudo, de uma leitura ingênua sobre a situação atual da época; e a “Tropicalha” – também movida pela impulsão do acontecimento Beatles, mas, com uma leitura completamente politizada. Gil, Tom Zé, Torquato Neto, Caetano Veloso, Capinam e Rogério Duprat, foram os principais idealizadores do movimento a partir de uma reinterpretação dos costumes brasileiros. Uma espécie de antropofagia cultural onde a música foi um dos principais elementos.
Foi nessa época que dois ilustres Alagoanos começaram a despontar para o cenário da música instrumental internacional, justo, pelas suas exuberantes performances musicais. Apesar da existência de ícones como Heckel Tavares, Jararaca, Augusto Calheiros e o maestro Fon-Fon, Florentino Dias e Hermeto Pascoal representaram para o nosso Estado, a partir de então, um novo ciclo perante a música nacional e internacional.
Florentino Dias, com inclinação mais para o erudito e natural de Traipu, deixou sua terra aos nove anos, mas, antes estudou com o maestro Nelson Palmeira levando consigo o doce melódico das águas do São Francisco. No Rio de Janeiro depois de fazer carreira no Corpo de Fuzileiro Naval, tornou-se professor do curso de Música da Universidade Federal (onde fora estudante) prestando grande serviço musical para o Estado e o seu país. Após fundar a Orquestra Filarmônica Estudantil do Diretório Acadêmico Padre José Maurício em 1962, a Sinfônica da UFRJ 1969 e a Filarmônica do Rio de Janeiro no ano de 1978, viajou pelo mundo a convite de diversos países para reger grandes orquestras.
Hermeto Pascoal, mais voltado para a música popular em especial o jazz, deixou sua cidade Lagoa da Canoa aos dezesseis anos rumo à Recife, Rio de Janeiro e depois o mundo. Este músico, a exemplo de Villa-Lobos, virou referência instrumental para o país e o mundo. Para se ter uma idéia da dimensão da questão, Egberto Gismonti – outro grande músico internacional nascido no Estado de Minas Gerais – diz ser Hermeto a própria música. Multinstrumentista e exímio compositor, suas obras vão do popular ao erudito sendo o experimentalismo um elemento relevante a se observar.
Recebendo todas essas informações sobre os acontecimentos nacionais e internacionais, Alagoas continuou tecendo sua história musical de acordo com o cardápio que lhe era apresentado. Em Viçosa o maestro D. Ratão tocava sua orquestra utilizando um repertório jezístico. Arapiraca também foi outra cidade onde músicos como o trompetista Edson Ferro, os tecladistas Diógenes e Pedrinho, o contrabaixista Dija e entre outros viviam a música instrumental sobre a influência do jazz, mas sobre tudo com o chorinho, samba e frevo. Com essa mesma desenvoltura os irmãos Basilio em Traipu, os irmãos Ramos em Pão de Açúcar e muitos outros espalhados por todo o Estado desfrutavam da novidade musical no início dessa era lunar.
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Depoimento Três: Diógenes
No final dos anos setenta ou mais precisamente em 1979 o teatro Deodoro deu para Alagoas o primeiro passo de suma importância no que diz respeito à música erudita criando, assim, a Orquestra Filarmônica. Sua existência pode ser considerada efêmera com duração de aproximadamente dez anos, mas, a relevância desse fato está na movimentação causada sobre este gênero musical.
Com a criação do curso de música na Universidade Federal de Alagoas em 1981 o Estado ganhou mais outra orquestra sendo sua formação de câmara, com até quarenta músicos. Essa atitude acabou tendo duas faces, ao mesmo tempo em que intensificou a movimentação desse setor a falta de maturidade das instituições e, até mesmo o ego dos responsáveis como também a carência de material humano, gerou mais tarde a extinção de uma delas, no caso, a Orquestra Filarmônica de Alagoas.
A Orquestra de Câmara da Universidade Federal de Alagoas seguiu seu curso no tempo chegando aos dias atuais sem que possamos atribuir-lhe grandes honras. No entanto, foi na mesma universidade em meados dos anos noventa que aconteceu o um dos fatos mais importante para a música erudita do Estado, se assim podemos dizer. Através do musicista cearense Joselho Rocha, radicado em Alagoas desde os anos oitenta, foi criada a Orquestra Contemporânea de Alagoas. Era uma orquestra de câmara formada por alunos do curso de extensão da própria universidade. No repertório, além de compositores já consagrados internacionalmente, a principal característica girava em torno dos compositores locais construindo, dessa forma, uma identificação sonora para o grupo o qual nos referimos. Sua existência foi um relâmpago que continua aceso no sonho dos loucos dessa era lunar, os românticos por uma música longe do estresse mercadológico.
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Depoimento Quatro: Almir Medeiros
Os anos oitenta foram mesmo de uma fertilidade musical para todo o país. Na música vocal, outro ilustre alagoano que fora embora da sua terra em busca de dias melhores nos anos setenta, explodiu para o mundo com o seu violão debaixo do braço andando na contramão da tendência musical da época. Até parece que é a sina do alagoano nadar contra a correnteza. Contudo, Djavan mostrou que sua sina estava marcada com uma estrela reluzente. Sua música de alto padrão foi chegando de mansinho e quando os brasileiros se deram conta já estavam totalmente envolvidos pelas melodias bem casadas com poesias leves falando sobre o amor como ninguém. Sua produção tornou-se uma escola musical da qual até hoje influencia artistas mundo afora.
Após duas décadas de repressão militar, finalmente, os festivais voltaram a acontecer. Em Alagoas os festivais estudantis se espalharam por todos os lados, mas, um deles – o Festival Universitário - emergiu trazendo uma safra de artistas que viriam para marcar com veemência o início de uma música popular criativa e característica do Estado. Embalados pela musicalidade dos anos setenta, Maclem, Almir Medeiros, Júnior Almeida, Deyves, etc. aterrizaram com suas asas deltas (alagoanos) como uns verdadeiros loucos da “Era Lunar”. O que aqui chamamos de louco diz respeito à ousadia das performances traçadas por esses artistas de forma que não mediam esforços nas atitudes não convencionais dos arranjos, das composições, de cantar, enfim, a lógica musical estava presente, mas, o interessante mesmo era descobrir o novo.
Eles não foram absorvidos pelo mercado fonográfico nacional, como diz a expressão “entrar para o circuito da música, acontecer”, no entanto, a nossa música deu um salto de qualidade relevante. A partir de então a produção discográfica dos artistas alagoanos começou a aparecer de forma independente. Não ficou esperando o produtor de uma grande gravadora. Os artistas tinham pressa e precisavam mostrar para o seu povo aquela produção, muito embora, não estivesse nas paradas das ondas radiofônicas.
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Depoimento Cinco: Deyves, Maclem e Júnior Almeida (jogral)
AUGE DA MÚSICA DE MASSA
Dois movimentos acontecidos no Nordeste brasileiro foram de suma importância para o desfeche desse último episódio. O primeiro acontecido no Estado da Bahia nos anos oitenta e explodindo na década de noventa tendo como fundamento uma música resultante do frevo pernambucano adaptado ao trio eletrizado, ficou caracterizado, principalmente, pela abundância percussiva bem como as coreografias de massa. Na realidade esse movimento não passou de uma articulação mercadológica para lançar artistas de Salvador já estruturados musicalmente no cenário nacional com a denominação de “Axé Music”. O segundo com mais característica de movimento e que também acabou virando rótulo mercadológico para lançar artistas pernambucanos no circuito musical brasileiro, o “Mangue Beat” veio à tona em meados dos anos noventa com uma postura sócio-cultural do homem caranguejo utilizando o rock vestido de maracatu e outros acessórios rítmicos como tambor de alfaia, caixa, agogô, etc.
Em meio a essas duas movimentações maiores outros rótulos, puramente mercadológico, como pagode carioca, sertanejo, forró merengue, funck, rap, enfim, o que teria se formado no final dos anos sessenta com base na cultura de massa, tornou-se uma onda gigante de artistas e grupos enfileirados pela música descartável invadindo, por assim dizer, o território brasileiro limitando, pois, o mercado da música de elaboração sofisticada, ou melhor, a música artística produzida neste país.
A carência educacional do Estado de Alagoas com que foi submetida ao longo de sua formação político-cultural possibilitou ainda mais a invasão modística sobre o que aqui era produzido. Uma variada classe musical acabou se rendendo aos apelos do axé, pagode, dupla sertaneja, forró merengue, brega e tantos outros rótulos surgidos serialmente como ponte para o sucesso em prol do capital. Nesse momento muitos artistas e grupos alagoanos iludidos em fazerem sucesso nacional acompanharam a onda criando um mercado passageiro e sem sustentação. Pois, para se sustentar tinham que vir de onde o comércio fonográfico havia partido (o que era muito complicado). Aqui funcionava apenas como área de consumo. Os artistas mais destacados dessa leva foram Roberto Barbosa, Geo D’Almeida e Banda Omim num primeiro momento. Mais para o final da década de noventa apareceram Conversa Fiada, Cara Véia, Cobra Criada e muitos outros.
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Depoimento Seis: Roberto Barbosa
A partir da segunda metade da década de noventa alunos universitários, em sua maioria do curso de comunicação, engrossaram a fileira do “Mangue Beat” no Estado de Alagoas. Vários grupo e artistas se Lançaram à conquista de um lugar na tão desejada onda do circuito musical brasileiro e do exterior. Live in The Shit, Xique e Baratinho, Sonic Júnior, Oxe e Wado foram os nomes que mais evidência teve entre tantos outros.
Se na década anterior os artistas buscavam o aprimoramento das composições através de uma nova descoberta, nos anos que sucederam à década de oitenta a preocupação foi outra. Os artistas trocaram o aprimoramento pela a articulação mercadológica. Um equilíbrio bastante complicado de se viver no dia a dia de quem faz arte como profissão.
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Depoimento Sete: Wado e Lelo
CONSIDERAÇÕES FINAIS
O momento explosivo da música de massa não significou a ausência total de resistência dos artistas autorais alagoanos. Mesmo sabendo da fúria em que se encontrava a onda de massa estendida país a fora os artistas da música artística alagoana continuaram a fazer suas produções como sempre o fizeram aprofundando ainda mais suas pesquisas musicais.
Idealizado pelo antropólogo Edson Bezerra o “Sururu Cult” foi, talvez, o único surto de movimento com base estrutural bem fundamentada da cultura alagoana. Das três formas de escravatura acontecida nas Américas, a brasileira foi a que mais resistiu à imposição cultural européia. Alagoas, apesar de sua história ser marcada por perseguições, é um dos Estados nordestinos melhor beneficiados pela cultura Afro-descendente. A abundância rítmica, melódica e de manifestações espontâneas dos folguedos existentes no Estado são facilmente identificados.
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Depoimento Final: Édson Bezerra
Assim sendo, dentre a diversidade musical que se tem em Alagoas, há um ritmo ainda pouco divulgado chamado de “Boi de Carnaval Alagoano”. Outros preferem chamar de “Boi Bumbá” ou Bumba-Meu-Boi. Na realidade essa manifestação está em fase de transformação onde já faz mais de uma década, pelo menos, que sua forma estrutural distanciou-se do “Bumba-Meu-Boi”. Todavia a ausência de pesquisa que busque esclarecer tal fato ainda não despertou estudiosos dessa área. De todo modo o que podemos dizer sobre isso é que o “Boi de Carnal Alagoano” tem fortes possibilidades para se transformar num produto musical mercadologicamente viável.